11/12/08

A vida corre näo muito dificilmente por aqui. Exceptuando os miúdos que correm e se escondem em todas as esquinas, com os seus gorros coloridos e casacos michelin, para fugir aos projécteis dos seus amigos nas constantes guerras de bolas de neve, tudo funciona muito suavemente. Näo lentamente ou com inércia, torpor. Suavemente.
As pessoas com pressa de chegar ao conforto do lar, näo ao vício deste, devido ao imenso frio que se faz sentir, param nos semáforos à espera do bonequinho verde, esperando a sua vez à mercê de temperaturas de cinco e seis graus abaixo de zero, cordial e inevitavelmente. Os automóveis, ávidos da próxima mudanca e de justificar o uso das suas potentes entranhas, näo se atropelam nos cruzamentos.
Sou cumprimentado vezes sem conta, nas ruas estreitas iluminadas pelas decoracöes habituais da época, a partir das quatro da tarde. Normalmente, sorrio. E reproduzo um qualquer esgar sonoro com a minha boca semicerrada. Näo me consigo habituar à ideia de saudar alguém com um "Grüss Got" - grande deus - todos os dias. Excluindo uma situacäo particular, há dois dias atrás, quando me cruzei com duas simpáticas freiras e, num único movimento tirei o meu chapéu de aba larga, fiz uma pequena vénia com a cabeca e o disse com um sorriso. Traquina. A traquinice de sempre recomeca a ser habitual. Ou sempre cá esteve, dissimulada. Mascarada de seriedade e vestida de formalidade e desejo de crescimento (ou que assim parecia), de enquadramento. Pontuada pela sensatez natural, pelo reconhecimento da mesma e pelo acumular de experiências, vem ao de cima nos momentos mais inesperados como se vivesse por si própria e de si própria se alimentasse. Näo há calor mais quente do que o das bochechas quando se contraem e permitem ao cantinho mais agudo dos lábios alargar o seu passo, alugar à face mais espaco, até mostrar ao mundo o exército branco dos trinta e dois dentes. Supor-se-ia um processo deveras complexo, näo fosse simplesmente um sorriso acompanhado de um arrepio quentinho que trepa espinha acima.
Neva! As bolinhas de côr alva misturam-se em mim como as ervilhas num prato típico de jardineira à portuguesa. Sorrio. Rio alto.
A única razäo ilógica que forca uma pessoa a esquecer-se de si própria e do que a fermenta é o acreditar inadvertidamente que näo se tem a capacidade para sorrir, para ser completa em si mesma. Um bater de mäo no chäo antes do KO técnico. Gosto de ser traquina! Ser traquina também me completa.

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