16/01/09

O toque do copo já meio cheio no meio, também, do fim da claridade e dos passeios à beira estrada. O frio cresce de minuto a minuto. O Sol bandido, incógnito por detrás dos prédios minúsculos de dois e três andares, dá por finda a jornada e os passeios das cores quentes, segredando já baixinho um "até amanhã". O cálice adquire uma côr vermelho-acastanhada, deixando o reflexo e os tons vivos à espera de outro fim de tarde. Lá fora, tudo anda, tudo mexe. A grupos de três e quatro, os transeuntes sorridentes e apressados inspiram os primeiros aromas frios da noite. A noite tem um cheiro característico aqui. Se não estão zero, os benditos graus disfarçam como ninguém. A passo acelerado, mochila às costas ou saco na mão, cachecol tentacular no sopé da cabeça, os pioneiros individuais marcham de olhos no chão, atentos ao seu próprio compasso, ritmo distraído, cabelo curto mastigando a testa e os olhos, de sobretudo escuro e ligeireza na sola das botas castanhas.
Por princípio, nego o carácter de surpresa aos encontros, aos olhares que poisam no outro lado da estrada, cuja impermanência dista apenas duas fileiras de veículos enervados, dois pares de olhos de todos os feitios e cores, faróis que se atropelam e sucedem, num ruído de luz quase irrelevante e, de repente, silencioso. O campo de visão roda tridimensionalmente como num projecto académico de arquitectura dos espaços, de arquitectura dos quarteirões do destino, de opção aleatória por um dos passeios que dão a mão à estrada de alcatrão. Sem o saber, coloquei as fichas no vermelho. O telefone chamou-me. Atendi. Confidenciei à voz do outro lado que, na roleta dos acasos, no póker das coincidências (será que as há?), saiu preto. Na minha casa vermelha, deste lado da rua, tombou o preto de cachecol azul, em passo apressado do outro lado da rua. Não sei se perdi se ganhei... Uma vez que nem havia jogado.

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