16/11/08

Um francês negro de quarenta e cinco anos, aproximadamente, e um cigano de parte nenhuma (ou de todas as partes do mundo) com sessenta anos às costas - literalmente!
Em pouco mais de dez minutos já todos falavamos animadamente. As experiências de cada um perfilhavam-se no centro do triângulo, no passeio já demasiado frio da manha (- preciso de um casaco - pensei).
O cigano, com as suas histórias dos arredores do mundo, encantou-me. Era uma personagem simpática, inebriante mesmo, que atraía para si os olhares dos passavam na rua. Olhou-me de uma forma estranha. Semelhante à que eu mesmo utilizo quando reconheco algo e comeco a analisar. A minha veia algo "cigana" veio ao de cima... Näo tardava, já estava a raspar os cantos da minha colher de pau iniciada em St. Pierre Cherignat com o canivete dele. Já trocavamos tabaco e utensílios à mesma velocidade a que trocavamos experiências e histórias. Näo trocámos nomes. Era, sem dúvida, um elemento sem qualquer importância a partilhar. Talvez devido à efemeridade do encontro. Um encontro sem títulos.
Afastei-me dez minutos para um café e uma garrafa de água. Cansado, "desolhado", e com sede, esgueirei-me pela porta principal de um pequeno café de estacäo, sempre com um olho no saco de viagem, apesar da solicitude do meu novo amigo no que tocava a tomar conta.
Quando regressei, 5€ depois (raios...), o negro ainda dizia mal da vida e das suas experiências em Franca. Havia decidido emigrar para a Alemanha, para Estugarda, e viajava sob a promessa de um emprego melhor e condicöes sociais mais atraentes. Cá como lá!
O cigano, vendo-me regressar, pediu-me para lhe devolver o favor e deixou o que parecia toda uma vida à minha guarda, enquanto se precipitava na direccäo do mesmo café de estacäo. Voltou com uma garrafa de água numa mäo e, pasme-se, um cobertor de lä na outra mäo. - Foi gratuito! -dizia ele entre sorrisos malandros. Näo tinha dentes! Isso ainda lhe dava mais graca quando sorria.
Finalmente, uma hora depois, o autocarro que supostamente chegaria as dez horas, atravessou o portäo do parque de estacionamento. Um sorriso cúmplice e "hop" - lá estavamos, cada um em sua fila, sentados com as costas tortas como é normal, a caminho de Paris.
É engracado e irónico que, pela fugacidade do encontro das nossas três individualidades täo diferentes e demarcadas, eu me tenha sentido estranhamente acompanhado e munido de um sentimento caseiro, quase familiar...

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